O STF pode ter autorizado o “princípio do fim” da sonegação fiscal

Em reunião desta quarta-feira, dia 24, o STF considerou legítimo o poder da Receita Federal e de outras autoridades fiscais de obterem dados bancários de contribuintes sem autorização judicial, legalizando assim a Instrução Normativa nº 1.571 de 03/07/2015 que obriga as Instituições Financeiras a prestarem informações relativas às “operações financeiras” dos contribuintes e de interesse da Secretaria da Receita Federal.

A referida Instrução Normativa instituiu a “e-Financeira” que deverá ser transmitida pelas Instituições Financeiras ao ambiente do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) pelas pessoas jurídicas obrigadas a adotá-la, nos termos do § 1º da Lei Complementar nº 105, e que são as seguintes:

Os bancos de qualquer espécie • distribuidoras de valores mobiliários • corretoras de câmbio e de valores mobiliários • sociedades de crédito • financiamento e investimentos • cooperativas de crédito • sociedades de crédito imobiliário • administradoras de cartões de crédito • sociedades de arrendamento mercantil • administradoras de mercado de balcão organizado • associações de poupança e empréstimo • entidades de liquidação e compensação • bolsas de valores e de mercadorias e futuros • outras sociedades que em razão da natureza de suas operações assim venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional.

A primeira entrega da “e-Financeira” será em maio de 2016, contendo dados de movimentações financeiras dos contribuintes a partir de 1º de dezembro de 2015.

Entre outros dados, aquelas instituições financeiras estarão obrigadas a prestar à Receita Federal informações sobre o saldo no último dia útil do ano de qualquer conta de depósito bancário ou não, inclusive de poupança; rendimentos brutos, acumulados anualmente, mês a mês, por aplicações financeiras; aquisições de moeda estrangeira; valor de créditos disponibilizados ao cotista, acumulados anualmente, mês a mês, por cota de consórcio, etc.

Por exemplo: se uma pessoa física pagou um prêmio de seguro de um automóvel de mais de R$ 2 mil em um mês, essa informação será enviada para o fisco. Se ela paga mais de R$ 2 mil por mês de cotas de consórcios, isso também será notificado. Se ela aplicar ou retirar mais de R$ 2 mil da poupança, também. Em caso de pessoa jurídica o valor é de R$ 6.000,00 por mês.

As informações contidas na e-Financeira, inclusive os saldos de conta corrente e de poupança nos bancos, serão confrontadas com as prestadas pelos contribuintes na Declaração Anual do Imposto de Renda, que serão entregues entre março e abril de cada ano, inclusive na deste ano.

Nem mesmo os depósitos dos brasileiros nos Estados Unidos estarão fora do alcance da Receita Federal do Brasil, já que em 23 de setembro de 2014 ela firmou acordo com a Administração Tributária dos Estados Unidos, conhecida como FATCA, iniciais da sigla em inglês para Foreign Account Tax Compliance Act, na modalidade de reciprocidade total, que estabelece intercâmbio de informações prestadas pelas instituições financeiras dos respectivos países. E a partir de 2018, o intercâmbio de informações será feito com aproximadamente 100 países.

Essa Instrução Normativa 1.541 e a respectiva Lei Complementar 105 na qual ela se baseia estava sendo contestada no STF por diversas entidades, por suposta violação do sigilo bancário que exige decisão judicial para tal.

Contudo, na sessão do STF desta 4ª feira, dia 24/02/2016, por 9 votos a 2, os Ministros do Supremo consideraram legítimo o poder da Receita Federal, e de outras autoridades fiscais, de obterem dados bancários de contribuintes sem autorização judicial.

Sem dúvida esse instrumento vai dar a Receita Federal capacidade para controlar a “lavagem de dinheiro”, a “corrupção” e a “sonegação”.

A pergunta que muitas empresas e autônomos estão se fazendo neste momento é: “o que fazer agora”?

Com respeito ao envio das informações pelas entidades financeiras para o Fisco não há nada a fazer. Sim ou sim essas informações serão enviadas.

Com respeito às Declarações do Imposto de Renda que serão enviadas nos próximos meses de março e abril, seria conveniente que as pessoas físicas e jurídicas procurassem ajustá-las o melhor possível às suas reais movimentações financeiras, porque se houver uma discordância acentuada entre as informações prestadas pelas instituições financeiras e a declaração entregue, o contribuinte poderá ser chamado a prestar esclarecimentos. E se não convencer, poderá ter o imposto lançado, com multa, juros e correção monetária.

A partir de agora a Receita terá a sua disposição todo tipo de informações financeiras em seus computadores, seja de pessoas físicas como jurídicas e, obviamente, a movimentação financeira precisará guardar certa conformidade com a declaração de renda.

No caso das empresas, juntando as informações que a Receita Federal já possui dos vários módulos do ambiente SPED e da Nota Fiscal Eletrônica com as informações do e-Financeira, será quase impossível burlar o sistema. A menos é claro que a empresa não se utilize do sistema financeiro de nenhuma maneira. Só se maneje com dinheiro vivo. Mas, isso é praticamente impossível nos dias de hoje.

Para aqueles que têm “atração pelo jogo”, seria preciso levar em conta que esse é um “jogo de cartas marcadas” pela Receita, já que hoje em dia ela dispõem de potentes computadores dotados com programas que possuem algoritmos complexos, supersofisticados e inteligentes, capazes de processar enormes quantidades de dados, “big data”, e cruzar milhões de informações num instante.

Assim como o Google conhece todos os nossos passos na Internet e sabe tudo o que fazemos e compramos, os computadores da Receita Federal também irão saber tudo o que fizermos financeiramente, seja através das instituições financeiras, como no caso das empresas, dos vários módulos do SPED e da Nota Fiscal Eletrônica.

O que se pode fazer para o futuro.

1. Se você acha que a carga tributária brasileira é muito alta, o único caminho democrático a seguir é o do Congresso Nacional juntamente com os demais contribuintes para, pacificamente, tentar forçá-lo a modificar o sistema tributário atual com o objetivo de reduzi-la.

2. Todavia, enquanto isso não se der (se é que algum dia num futuro previsível vai se dar) não resta alternativa a não ser aceitar a realidade dos fatos e procurar se ajustar fiscalmente, tanto como pessoa física, como jurídica. Ou seja, pagar os impostos devidos.

No caso das empresas que fizeram algum tipo de “planejamento tributário” com o objetivo de reduzir a carga tributária, se esse planejamento for autêntico e estiver sendo praticado corretamente, é uma forma lícita de operar e, portanto, não há com que se preocupar.

Todavia, se esse planejamento tributário foi montado com a finalidade específica de tentar “burlar o fisco” para pagar menos impostos, esse planejamento está com os dias contados, porque será facilmente identificado pelo fisco.

Por exemplo: é comum uma empresa que cresceu se desmembrar em duas para lançar despesas para uma empresa que paga pelo lucro real e receitas para a empresa que paga pelo lucro presumido.

Nesse caso, observe o seguinte: ao instituir a modalidade tributária baseada no “lucro presumido” as autoridades fiscais se basearam no fato de que, devido à enorme concorrência e às facilidades de comparação de preços existentes hoje em dia, uma empresa que pratique o comércio dificilmente consegue ter um lucro bruto maior que 8%.

Por isso, a Receita entendeu que se o empresário quiser correr o risco de pagar 15% de Imposto de Renda sobre esses 8% de lucro bruto “presumido”, ou 1,2% da receita bruta mensal. Tudo bem. Ela se dá por satisfeita, porque sabe que a maioria não vai conseguir ter essa margem de lucro e vai acabar pagando mais imposto do que o devido.

Se a empresa for de prestação de serviços, então a Receita Federal supõe que, como há maiores possibilidades de diferenciação dos serviços, a margem bruta pode ser maior chegando até a uns 32%. Assim, o empresário que quiser correr o risco de pagar 15% de Imposto de Renda sobre esses 32% de lucro bruto “presumido”, ou 4,8% da receita bruta, tudo bem também. Igualmente ela se dá por satisfeita, porque sabe que a maioria não vai conseguir chegar a ter essa margem de lucro e vai acabar pagando mais imposto do que o devido.

Então vamos a um raciocínio simples: suponha que uma empresa de comércio faturou R$ 100,00 e pagou 1,2% de Imposto de Renda sobre esse valor a título de Imposto de Renda sobre o “lucro presumido”.

Por presunção “juris tantum”, ou que se aceita prova em contrário, entre compras de mercadorias para revenda, mais outras despesas, a soma de custos de uma empresa de comércio deverá se situar ao redor de R$ 92,00 ou mais (100-8).

Então, se devido ao “planejamento tributário” o grupo empresário jogar a maior parte das despesas da empresa que paga pelo lucro presumido, para a outra empresa que paga pelo lucro real, o que vai acontecer?

Simples: a sua margem bruta vai ser muito maior que os tais 8% presumidos pela Receita, já que ele não tem despesas… ou tem pouca despesa.

Por exemplo: se a empresa paga Imposto de Renda sobre um faturamento de R$ 100,00, mas os seus custos totais giram em torno de R$ 50, a Receita Federal vai querer conhecer a “mágica” que esse empresário faz para, num mercado recessivo e altamente competitivo, conseguir uma margem de lucro bruta de 50% sobre vendas.

Mais, vai querer saber também como esse “hábil administrador” é capaz de ter uma margem de 50% na empresa de lucro presumido e 0% de lucro da empresa de lucro real.

Se ele conseguir comprovar que é verdade, tudo bem. Mas, se não conseguir, vai ter de pagar os impostos devidos, com multa, juros e correção monetária. E, como a Receita pode autuar até os últimos 5 anos, a conta poderá ser muito salgada.

O mesmo raciocínio se aplica àquele outro modelo de “planejamento tributário” feito com o objetivo de desmembrar uma empresa que se tornou de médio porte, em várias microempresas para continuar pagando pelo Simples Nacional.

Inevitavelmente vai acontecer a mesma coisa: uma vai acabar apresentando uma margem de lucro muito grande, já que alguns custos não são passíveis de compartilhar. E, se a empresa fosse fazer tudo direitinho, ou seja, duplicar todas as operações e administração, ela iria acabar tendo custos duplicados e esse planejamento perderia seu sentido.

A prática de algumas empresas de, por exemplo, emitir 1.000 boletos bancários e apenas 200 faturas, também acabou, porque como os números informados pelo banco vão contrastar com os números do faturamento, essa prática também será facilmente detectada.

Diante dessa nova realidade fiscal, penso que o ideal seria as empresas que fizeram algum tipo de planejamento tributário não legítimo, tratar de desmontar logo esse circo antes que ele seja descoberto.

Porque se ele for descoberto, deverá ser desmontado facilmente pela Receita Federal, porque no campo do Direito Civil, a utilização da ELISÃO FISCAL para fins espúrios, acarreta a anulabilidade do negócio jurídico. Ou seja, se é anulável, poderá ser anulado. E anular significa, invalidar, reduzir a nada, destruir, eliminar, etc.

Em outras palavras, uma vez detectado o objetivo espúrio do planejamento tributário, a Receita Federal poderá anulá-lo, desmontar o circo e lançar os impostos devidos até dos últimos 5 anos, com multa, juros e correção monetária, pois se trata de uma ilicitude.

No campo do Direito Penal Tributário configura o chamado “delito econômico” e adquire relevância no contexto dos chamados CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. Ou seja, o administrador responsável poderá ter de responder criminalmente pelo ato praticado. E, se julgado culpado em 2ª instância, certamente não irá parar trás das grades, porque não há lugar nas cadeias brasileiras…, mas perderá sua primariedade e imediatamente poderá ter de prestar serviços comunitários nos finais de semana para pagar sua pena.

Daqui para frente, pagar parte dos salários por fora para tentar reduzir parte dos custos dos encargos e benefícios sociais, pode ser uma furada, porque a movimentação financeira do empregado não irá bater com a sua declaração de renda e ele poderá ter de se explicar ao fisco sobre a origem do dinheiro.

Eu sei que este artigo poderá atrapalhar o sono de alguns leitores, mas como consultor de empresas não poderia agir diferente, preciso ser sincero e honesto, porque o problema é efetivamente sério e urgente.

Diante do exposto, fica claro que para se ajustar a essa nova realidade fiscal, que irá impactar enormemente o custo das empresas que até então estavam se utilizando de algum expediente para “aliviar” a pesada carga tributária, a única saída será a busca determinada e incessante da “EFICIÊNCIA”. Mas, esse será tema do nosso próximo artigo.

Contudo, se até lá, sua empresa precisar de ajuda para se reorganizar eficientemente dentro da nova realidade tributária, não hesite, entre em contato conosco. Consultoria é para isso mesmo: ajudar as empresas a resolverem problemas incomuns.

Prof. Faccin

• Para ler a íntegra a Instrução Normativa 1.571 da Receita Federal utilize o link a seguir: IE Nº 1.571

fonte: http://sescap-pr.org.br/noticias/post/o-stf-pode-ter-autorizado-principio-dofimda-sonega-fiscal.

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